''Fui atacada pelo maníaco da seringa''
O metrô estava lotado como de costume. A caminho da
faculdade, lá ia eu espremida no empurra-empurra. Nisso o trem chegou à estação
Sé. E, do nada, eu senti uma espetada no lado esquerdo da minha cintura. Logo
percebi que não se tratava de um simples esbarrão. Algo mais grave havia
acontecido. O desespero tomou conta de mim e instintivamente olhei ao meu
redor, tentando achar alguém que pudesse estar me encarando com ar culpado ou
com algo pontiagudo nas mãos. Foi em vão. Eu me senti num pesadelo. E ele
estava apenas começando...
Desci na estação seguinte, a Liberdade, ainda em choque.
Quando olhei para o local onde sentia dor, vi uma pequena mancha de sangue e um
furo feito por agulha. Lembrei das notícias sobre o 'Maníaco da Seringa', que
picava pessoas com agulhas infectadas, e aos prantos liguei para minha mãe.
Chorava tanto que ela mal conseguia entender o que eu falava. ''Filha, procura
ficar calma e volta já para casa'', pediu. Chorei os 40 minutos do caminho.
Todo mundo me olhava, mas ninguém se disponibilizou a me ajudar.
Assim que cheguei, minha mãe me levou para o Hospital Emílio Ribas, referência em
infectologia. A declaração da recepcionista ao saber do meu caso conseguiu me
deixar ainda mais preocupada do que eu já estava: ''Você é a nona que aparece
aqui hoje''...
Após me fazer diversas perguntas, o médico prescreveu três
remédios diários – para prevenção do vírus HIV, hepatite e calmantes, todos
eles fornecidos no posto de saúde. Tomei os medicamentos por 28 dias e os
efeitos colaterais não foram nada fáceis... Dor de cabeça, enjoo, vômito. Foi
horrível, mas ao menos funcionou: 30 dias após o acontecido, exames de sangue
constataram que não havia sido infectada por nada. Nem HIV nem hepatite. Nada!
O metrô não libera as
imagens do vagão para eu assistir
Infelizmente não consegui identificar até hoje a pessoa que
me atacou, porque o metrô não libera as imagens do vagão. Eles dizem que o
reconhecimento pode fazer com que eu queira processar a pessoa por vingança,
pedindo indenizações abusivas, ou até mesmo, atentar contra a vida do maníaco.
Por isso, caso eles reconheçam a pessoa, é o governo que entra com o processo
sigiloso. Me senti muito aliviada quando soube que o suspeito de ser o maníaco havia
sido preso. Embora não tivesse certeza de que era o mesmo que me atacou, foi um
sentimento bom saber que ao menos aquele não faria mal a mais ninguém.
Depois de um mês sem conseguir usar o metrô, tive que voltar
a andar nele, porque minha vida não pode parar. Hoje ando mais atenta, presto
mais atenção nas pessoas que estão ao meu redor e tomo muito mais cuidado. O
trauma começa a melhorar, mas só de falar nesse assunto já me sinto mal.
Sami Fernandes,
22 anos, estudante, São Paulo, SP
Da redação
O primeiro ataque do 'Maníaco da Seringa' foi registrado em
maio de 2016, na região central de São Paulo (SP). A princípio, ele visava
apenas mulheres, mas já houve ocorrências também com homens. Encontrado com uma
seringa no bolso, um suspeito foi detido em junho. Acabou liberado, pois uma
das vítimas não reconheceu o seu rosto, mas voltou a ser preso a pedido da Polícia Civil. Portador de problemas
mentais, o suposto agressor foi encaminhado para um hospital psiquiátrico.
Tal detenção, porém, não resolveu o problema. Vários outros
casos aconteceram em São Paulo no segundo semestre de 2016 – e também em
Salvador (BA) e em Santos (SP), que registrou o primeiro ataque em dezembro do
ano passado. A maioria das vítimas procura o Hospital Emílio Ribas, especializado em infectologia, em São Paulo
e o Hospital Couto Maia, em
Salvador. A informação é de que mais de 20 pessoas tiveram atendimento em cada
um dos hospitais, mas sem um número exato da quantidade.
Embora as vítimas não recebam indenização do governo, os remédios
necessários são fornecidos pelos postos de saúde.
Estações de metrô de
São Paulo nas quais foram registrados ataques:
Pinheiros – Linha 4 – Amarela
Barra Funda – Linha 3 – Vermelha
Estação Sé – Linha 1 e 3 – Azul e Vermelha